II – VAI E FAZ TU O MESMO
É Jesus Cristo quem nos guia nos caminhos da vida. Ensina-nos a ser cidadãos conscientes e cristãos atentos. A Sua Palavra, o Seu Amor à humanidade, têm a força da pedagogia dirigida ao coração dos homens e das mulheres de todos os tempos. “Aquele que tem caridade no coração, tem sempre qualquer coisa para dar”, afirma Santo Agostinho.
Através da Parábola do Bom Samaritano, Jesus mostra-nos qual o caminho a seguir, o caminho do Amor ao próximo:
«Levantou-se, então, um doutor da Lei e perguntou [a Jesus], para O experimentar: “Mestre, que hei de fazer para possuir a vida eterna?” Disse-lhe Jesus: “Que está escrito na Lei? Como lês?” O outro respondeu: “Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo”. Disse-lhe Jesus: “Respondeste bem; faz isso e viverás”. Mas ele, querendo justificar a pergunta feita, disse a Jesus: “E quem é o meu próximo?” Tomando a palavra, Jesus respondeu: “Certo homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos dos salteadores que, depois de o despojarem e encherem de pancadas, o abandonaram, deixando-o meio morto. Por coincidência, descia por aquele caminho um sacerdote que, ao vê-lo, passou ao largo. Do mesmo modo, também um levita passou por aquele lugar e, ao vê-lo, passou adiante. Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou ao pé dele e, vendo-o, encheu-se de compaixão. Aproximou-se, ligou-lhe as feridas, deitando nelas azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. No dia seguinte, tirando dois denários, deu-os ao estalajadeiro, dizendo: ‘Trata bem dele e, o que gastares a mais, pagar-to-ei quando voltar’. Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele homem que caiu nas mãos dos salteadores?” Respondeu: “O que usou de misericórdia para com ele”. Jesus retorquiu: “Vai e faz tu também o mesmo”» (Lc 10, 25-37).
Reflitamos:
– Um homem caído no caminho
No caminho estava caído um homem que foi assaltado, espancado e abandonado. Várias pessoas passaram a seu lado, mas não pararam, seguiram como se nada tivessem visto. Indiferentes, não tiveram compaixão, nem capacidade para o socorrer, ou pedir ajuda. Nesta situação descrita na parábola, podemos ler a história da humanidade que sofre com as chagas gravadas no corpo e no espírito, a história de homens e mulheres abandonados, marginalizados, vítimas da indiferença, descartados, que, também no nosso tempo, vivem na solidão. Este homem da parábola estava por terra, caído, vítima da maldade e da indiferença de muitos, mas, a um só, suscitou compaixão.
– Um só homem parou
Um só homem, um Samaritano, viu e parou. Sem o conhecer, esqueceu os seus afazeres, compromissos e desejos, encheu-se de compaixão e comoveu-se. Cuidou dele, abriu-lhe os olhos, lavou as feridas, transportou-o e confiou-o a um estalajadeiro a quem pagou a hospedagem do seu bolso, e prometeu voltar. Este homem tinha um coração que vê. Viu e atuou.
O Papa Francisco, no n.º 64 da Carta Encíclica “Fratelli tutti”, pergunta-nos: “Com quem te identificas? É uma pergunta sem rodeios, direta e determinante: a qual deles te assemelhas? Precisamos de reconhecer a tentação que nos cerca de se desinteressar dos outros, especialmente dos mais frágeis. Digamos que crescemos em muitos aspetos, mas somos analfabetos no acompanhar, cuidar e sustentar os mais frágeis e vulneráveis das nossas sociedades desenvolvidas. Habituamo-nos a olhar para o outro lado, passar à margem, ignorar as situações até elas nos caírem diretamente em cima”.
Também no n. 67 da “Fratelli tutti”, afirma: “Esta parábola é um ícone iluminador, capaz de manifestar a opção fundamental que precisamos de tomar para reconstruir este mundo que nos está a peito. Diante de tanta dor, à vista de tantas feridas, a única via de saída é ser como o bom samaritano. Qualquer outra opção deixa-nos ou com os salteadores ou com os que passam ao largo, sem se compadecer com o sofrimento do ferido na estrada. A parábola mostra-nos as iniciativas com que se pode refazer uma comunidade a partir de homens e mulheres que assumem como própria a fragilidade dos outros, não deixam constituir-se uma sociedade de exclusão, mas fazem-se próximos, levantam e reabilitam o caído, para que o bem seja comum. Ao mesmo tempo, a parábola adverte-nos sobre certas atitudes de pessoas que só olham para si mesmas e não atendem às exigências ineludíveis da realidade humana”.
O Papa Bento XVI, num encontro com voluntários na Áustria afirmou: “Jesus Cristo não nos ensina uma mística ‘dos olhos fechados’, mas uma mística do ‘olhar aberto’; e, com isso, o dever de perceber a condição dos outros, a situação em que se encontra aquele homem que, segundo o Evangelho, é o nosso próximo. O olhar de Jesus, a escola dos olhos de Jesus introduz numa proximidade humana, na solidariedade, na partilha do tempo, dos dotes e também dos dons materiais”. Por isso, “quantos trabalham nas Instituições caritativas da Igreja devem distinguir-se pelo facto de que não se limitam a executar de maneira hábil o que convém naquele momento, também isto é importante, mas dedicam-se ao outro com as atenções que o coração sugere… Este coração vê onde há necessidade de amor e age em consequência” (Deus caritas est, 31a; 31b).
Sim, “devo tornar-me uma pessoa que ama, uma pessoa cujo coração está aberto para se deixar incomodar perante a necessidade do próximo. Então encontro o meu próximo, ou melhor: é ele que me encontra”(Joseph Ratzinger / Bento XVI, GesùdiNazareth, Milão 2007, pág. 234).
Nesta Quaresma, tempo de preparação penitencial para a Páscoa, tempo privilegiado na vida da Igreja e tempo de conversão e de mudança de vida, somos chamados aos exercícios quaresmais da prática da caridade e das obras de misericórdia. Somos chamados a ser samaritanos, a ver e agir, a colocarmo-nos ao serviço dos irmãos que sofrem de fome, da falta de trabalho, das vítimas do Coronavírus, das vítimas de violência, de todas as formas de opressão, dos esquecidos, dos que vivem na solidão, dos que choram já com as lágrimas secas de tanto chorarem e dos que gritam sem se fazerem ouvir. Façamo-lo em qualquer circunstância, em todas as circunstâncias, isoladamente, em grupo, ou aderindo às Instituições sociais e caritativas que, no terreno, têm o mandato da Igreja para agir em seu nome, em nome de Jesus Cristo, o Bom Samaritano, que deu a vida por cada um de nós.
Esta parábola, hoje, é dirigida a cada um de nós. Façamos caminho, vamos ao encontro das inúmeras situações que necessitam de quem lhes limpe as feridas, lhes abra os olhos, de quem seja cuidador. Alguns estão tão próximos que nem os vemos, vivem ao nosso lado, na nossa rua, na nossa comunidade. É Jesus Cristo que nos diz: “VAI E FAZ TU O MESMO”
Neste tempo quaresmal, em 2021, peçamos ao Senhor que nos fortaleça na fé e nos dê um coração que vê para agir.
Portalegre, 22 de fevereiro de 2021
Elicídio Bilé
Secretariado Diocesano da Pastoral Social e Mobilidade Humana