Conclusões da 5ª Assembleia Diocesana da Pastoral Social
“Família, Solidariedade e Estado Social”
Nada será como dantes… Caridade ordenada e eficaz
Depois da 5ª Assembleia Diocesana da Pastoral Social da diocese de Portalegre-Castelo Branco realizada no dia 15 de Março/2014, na escola Secundária Dr.º Manuel Fernandes, em Abrantes, seguramente que nada ficará com dantes. Os cerca de trezentos participantes que responderam ao apelo do Secretariado Diocesano da Pastoral Social, escutaram palavras sábias dos oradores convidados e debateram, seriamente, o tema “Família, Solidariedade e Estado Social”.
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Na oração da manhã que abriu a assembleia, o Senhor Bispo, D. Antonino, trouxe à memória os saudosos: D. António Marcelino, Bispo emérito de Aveiro, e o Doutor António Borges, ambos falecidos, que no ano passado foram distintos oradores convidados daquela que em Castelo Branco foi a 4ª assembleia da pastoral social. Em seguida, o Presidente do Secretariado Diocesano, Elicídio Bilé, explicou as motivações e propósitos do tema em debate nesta 5ª assembleia, avançando desde logo com a problemática da crise instalada também nos lares e deixando no ar a questão: o que seria da sociedade se não existisse a família? E que Estado Social existe em Portugal? Mas logo adiantou que face às políticas sociais não correspondentes às necessidades da população, a Cáritas e todas as demais instituições sociais da Igreja aí estão, e, por força da missão da Igreja e da sua doutrina social (DSI), com “um papel próprio, importante e subsidiário na ajuda ao desenvolvimento, à promoção e à ajuda de emergência às famílias mais afetadas que enfrentam, dolorosamente, situações de pobreza”. Fatores que levam a uma sociedade deprimida mas, como bem apelou o pároco abrantino, cónego José da Graça, sendo “nós cristãos pessoas de esperança, esta assembleia seja oportunidade para nos abrimos à realidade e seja um motivo de compromisso para a nossa fé nas comunidades cristãs.
Ainda na sessão de boas-vindas, também a Presidente da Câmara Municipal de Abrantes se congratulou pela realização desta assembleia na cidade, e desejou que fosse momentos de reflexão sobre os fragilizados e para real consciência das realidades, nomeadamente o efeito demográfico do envelhecimento e da baixa taxa de natalidade. A edil aproveitou a oportunidade para enaltecer o papel crucial da Igreja e expressou a pertinência da ética do cuidado, parafraseando a também distinta cidadã abrantina e que foi Mulher honorífica nacional e Primeira-Ministra, a Dr.ª Maria de Lurdes Pintasilgo. Para debater a problemática e encontrar respostas, foi convidado especial o prof. Doutor António José de Castro Bagão Félix. Com enfoque na centralidade da família nas políticas sociais, o Dr. Bagão Félix discorreu elegantemente da família fundada na matriz cristã e sua natureza, e na dignidade da pessoa. A propósito, diferenciou a pessoa da simples definição de indivíduo (também o são o cão, a árvore, etc.). Mais esclareceu que a família é a única instituição natural e que é anterior ao Estado. Não foi imposta, não foi tecnicamente criada, nasceu do Homem. A família tem de ser valorizada, deve ser o espaço mais integrativo de ética e que a Lei é o limite inferior da ética. Mais adiantou que os fins não podem justificar os meios. Só podemos reestruturar e decidir no domínio das políticas sociais e da família se não forem míopes, sem subordinação à economia. Sobre os cortes orçamentais, Bagão Félix entende que o corte incidente nas pensões de sobrevivência é uma machadada. As políticas públicas sociais devem ser centralizadas e focadas nas famílias. O Dr. Bagão Félix alertou para a defesa da família, afirmando veementemente que o grande mal é a indiferença, no que citou Jean Quiton: “Deus não teme os opressores, os inimigos, mas os indiferentes.” A concluir referiu a sua preocupação pelo desemprego que afeta as famílias e a luta que é necessário travar na defesa da família, mas também a necessidade de olhar para a família, pois que sem tempo para o trabalho ou só com tempo para o trabalho estará seriamente comprometido o tempo para a família. A família deve-se impor como pedra angular das políticas sociais. É lamentável como no imperialismo mediático o que é notório é o fracasso da família e não o sucesso da família. Na opinião de Bagão Félix, não há solidariedade nacional sem solidariedade social, nem esta sem solidariedade na família, como já então sublinho o Papa Pio IX ao introduzir o princípio da subsidiariedade. Em análise semântica, destrinçou a sua preferência pela palavra “velho” em vez de idoso, como também gosta da expressão “agregado familiar”, que considera compósita. E foi claro na referência à utilidade dos lares mas como o último dos recursos, e foi perentório a dizer que não podemos deixar assistir ao eclipse dos velhos. Aflorando o papel do Estado Social e os direitos dos cidadãos, o Dr. Bagão Félix disse ser favorável a um Estado nem minimal nem plenipotente, com dever de proteger a paternidade e a maternidade não apenas biológicas mas sociais. Expressou também a sua preocupação pelo inferno demográfico num País Portugal que é o segundo país com menor taxa de fecundidade mas também um dos melhores na baixa mortalidade infantil. Neste contexto adiantou que na relação com a escola os pais não se podem demitir nem deixar substituir pela escola, é preciso reconhecer o direito dos pais à educação dos filhos, na certeza de que a educação começa em casa, na formação do carácter. A propósito, citou o papa João Paulo II: «há muitos filhos órfãos de pais vivos». O Dr. Bagão Félix colocou ainda o dedo em várias feridas, dizendo: não conheço um tratado europeu onde entre a palavra ‘família’. A Europa paga maias pelo abate de uma oliveira do que pelo nascimento de uma criança. A política fiscal tem de levar uma grande volta, favorece as uniões e os divórcios ainda que falsos, em vez de valorizar a família, há até na sociedade uma certa tentativa de fragmentar a relação entre gerações, uma brutal escalada a favor da eutanásia e da eutanásia sociológica, os velhos são vistos como um fardo, o ter filhos um risco logo a opção por não os ter, prefere-se o crescimento económico em detrimento do desenvolvimento humano. A austeridade não é um caminho único, nestes tempos de crise também tem que se fazer compaixão. A família Cristã deve ter um papel fundamental, para uma cultura de renovação geracional. Fora da família todas as soluções são falsas, efémeras. É preciso sobrepor nas políticas sociais o primado da família. Portanto, nós cristãos, sejamos militantes das causas em que acreditamos.
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O tema «desemprego, combate prioritário na região transfronteiriça» esteve em debate após o almoço com uma esclarecedora intervenção por Célia Costa que a partir da metáfora do clip abordou a crise da família na relação com o flagelo do desemprego e efeitos conexos e subsidiários como a perda de identidade e o retorno de pais de família à casa dos pais que os viu nascer. Na tentativa de explicação para este fenómeno, a Dr.ª Célia recorreu à parábola de Cristo ‘a casa construída sobre a rocha e a casa na areia’, no que apelou à base dos fundamentos fortes e consistentes no projeto de vida da pessoa e da família. Recorrendo ainda ao processo gerativo da metamorfose, apontou propostas de respostas de intervenção junto das famílias em situação de crise, adiantando ainda que “ninguém pode fazer por uma família o que ela não quiser fazer por si. Nós podemos apenas criar as condições para o seu percurso, pelo que a intervenção social deve ser mais educadora, libertadora, numa relação processual de reciprocidade na metamorfose dos atores da intervenção e, claro, nos sujeitos-alvo da família apoiada, lado a lado e na base do amor. Seguiu-se a apresentação da abordagem prática-experiência diocesana com base no território transfronteiriço Salamanca-Cáceres-Badajoz (Espanha) e Alentejo (Portugal). A estrutura demográfica foi referida como o maior problema comum e, claro, o desemprego. Nas medidas de intervenção propostas foram relevadas ideias-chave como a centralidade na pessoa em todas as dimensões da intervenção integral, nas ações significativas como norma, no território como marco de trabalho e na cooperação. O último painel temático «O serviço à Família iluminado pela DSI» foi refletido em mesa redonda com intervenções de Cristina Carvalhinho das Conferências de São Vicente de Paulo, Anacleto Batista, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Sardoal, Anabela Afonso representante da Cáritas Diocesana e Joaquim Leonardo Martins pela Comissão Diocesana Justiça e Paz. Das respetivas missões ficou clara a mensagem de que as frentes práticas de caridade estão no terreno com respostas diferenciadas e felizmente em articulação e intervenção social em rede até com outras instituições locais e estatais. O papel do voluntariado emergiu naturalmente e claro a necessidade de na intervenção se ter por referência a Doutrina Social da Igreja. Neste plano da doutrina, ao longo do dia o discurso temático aludiu a outros referentes documentais da Ação Social e da Família como a Laboren Exercens e a Familiaris Consortio de João Paulo II, a Evangelli Gaudium do Papa Francisco, a Carta dos Direitos da Família (1988) do Sínodo dos Bispos.
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A Assembleia terminou com o momento alto do dia, conforme palavras do Senhor Bispo, a celebração da Eucaristia a que presidiu. Na homilia, D. Antonino Dias apelou à conversão na oportunidade quaresmal, mas conversão de mente e de coração. É preciso dizer não à indiferença, de que o Papa Bento XVI alargava à dimensão da globalização da indiferença como um dos males destes tempos. A nossa fé não pode ser intimista, individualista, tem de ser uma fé de obras, temos de descer o monte e ir para a realidade do mundo, levar a esperança de Cristo, agir com o Amor de Deus, numa conversão que implica o êxodo, sair de nós mesmos, no projetar-se no outro, e nele ver a Cristo. Falamos muito da família, que continua a ser a célula base da sociedade, o primeiro espaço de humanização, o primeiro lugar de educação comunidade viva onde se espelha e espalha o amor. Há alturas em que parece que a família está a ser abandonada, até pelas políticas sociais. Mas a família permanece. E nós temos que aqui marcar a diferença. A família também tem de lutar pelos seus direitos, tem de se empenhar e libertar-se da situação de pobreza, com responsabilidade. Nós somos cristãos de esperança, e temos de mostrar como somos capazes de ajudar as nossas comunidades a serem felizes. Mas a nossa ação social não é mero assistencialismo, fundamenta-se na Doutrina Social da Igreja, que alguns dos responsáveis de instituições da igreja desconhecem ou conhecem mal. Congratulando-se pelas muitas e boas práticas de caridade de instituições como a Cáritas, as conferências vicentinas e outros, reiterou ainda o apelo ao fomento de Grupos de Ação Social a nível local/paroquial e valorizou a cultura da formação. D. Antonino disse que “a partir de agora, nada será como dantes”. Agradeceu a colaboração e os apoios das diversas entidades para a realização da assembleia diocesana e dirigiu-se em particular louvor ao Secretariado Diocesano da Pastoral Social, e concluiu: «a caridade tem de ser ordenada para que seja capaz de atingir a todos de forma eficaz.»
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Alfredo Bernardo Serra
Video da reportagem feita pela Agência Ecclesia
https://www.youtube.com/watch?v=2cED0k6BdUs&list=UUCRAIiRW-TTJT_vHIrkr40Q&feature=share&index=3