Entrevista ao Ecos do Sor
Presidente da Cáritas considera que a solução não pode passar “pela penalização do trabalho”
“Mais austeridade conduz-nos ao desespero”
“A serem aprovadas como estavam vinham agravar substancialmente uma situação que já de si era péssima”. É desta forma que o presidente da Cáritas Diocesana de Portalegre e Castelo Branco reage às medidas de austeridade anunciadas pelo governo para o ano de 2013. Em declarações ao Ecos do Sor, Elicídio Bilé (na foto) frisa que as pessoas da nossa diocese já chegaram a uma situação tão grande de desespero que as soluções encontradas pelo governo viriam agravar ainda mais a vida das pessoas. “As famílias veem reduzidos os parcos recursos que têm”. O presidente da Cáritas alerta ainda para “o fator psicológico” que as soluções, encontradas pelo governo para reduzir o défice orçamental, provocam nas famílias da chamada classe média. “Sempre que há necessidade de tomar medidas de austeridade, o governo acaba por prejudicar sempre a chamada ‘classe média’. Aliás, hoje falamos em classe média mas impropriamente, uma vez que, por aquilo que me apercebo, a classe média, nos dias que correm, já é pobre”, aponta.
Os novos pobres
“Não são apenas os desempregados, nem as pessoas que vivem situações de grande fragilidade, que hoje em dia recorrem a nós. Recebemos inúmeros pedidos de ajuda de famílias em que um dos membros do agregado familiar ainda tem emprego, mas cujos recursos já são tão escassos que têm necessidade de pedir apoio”, observa Elicídio Bilé. “Nesta instituição tentamos devolver a esperança às pessoas que nos procuram. Tentamos dar uma palavra de incentivo, tentamos criar projetos por forma a ajudar a ultrapassar as situações de dificuldade em que vão vivendo. Medidas como estas são, no fundo, um retrocesso. Contrariam todo o trabalho que temos vindo a fazer. As pessoas perdem todo o sentido da esperança”, lamenta o presidente da Cáritas Diocesana.
É fundamental encontrar uma nova solução
É com “natural preocupação” que Elicídio Bile vê a hipótese da aprovação parlamentar das de mais medidas de austeridade anunciadas, porem, conserva alguma esperança em que “os deputados da maioria e os parceiros sociais tenham bom senso e que, de alguma forma, levem o governo a repensar e a alterar muitas das medidas previstas para 2013”. 0 presidente da Caritas admite que o governo “tem de equilibrar as contas publicas”, porem, considera ser “fundamental encontrar uma nova solução” para esse, fim. “Não pode ser só à custa do trabalho. Se assim for, a economia decresce cada vez mais porque deixa de haver poder de compra 0 que conduz a uma estagnação da economia”, assevera. “Durante anos cometeram-se verdadeiras loucuras em termos da definição de objetivos e da forma como eles eram prosseguidos, o que conduziu o pais ao estado em que esta. Agora há que recuar e ultrapassar o descalabro em que caímos, mas a solução não pode passar, sobretudo, pela penalização do trabalho”, reconhece.
Competitividade das empresas e aumento da produtividade
Elicídio Bile considera que parte da solução terá de incidir “na melhoria de condições para a competitividade das empresas e no aumento da produtividade”, o que, acrescenta, consegue-se, com estímulos às empresas, aos empresários e com trabalhadores motivados. “As medidas que tem vindo a ser tomadas, não estimulam nada, pelo contrário. Um trabalhador acorda de manha e não sabe se vai ser despedido nesse mesmo dia. O facilitismo nos despedimentos e· outras soluções que tem sido encontradas, não são propícias para que um trabalhador possa dar o melhor de si de forma a sentir-se motivado, aumentando assim a sua produtividade e, como consequência, a ‘competitividade da empresa onde labora, explica.
“A falta de esperança é o pior que pode acontecer”
De acordo como presidente da Caritas, outra das soluções passa pelo óbvio corte nas despesas do Estado. “Já que falamos em rendimentos do trabalho, ainda não ouvimos nenhuma medida que toque, de forma substantiva nos vencimentos dos políticos ou dos gestores públicos”, acusa. “E como podemos nós pessoas em geral, ter uma perspetiva de futuro a medio prazo’ quando não vemos nada de concreto no presente. Tudo isto contribui para que haja esta instabilidade,’ esta insegurança e esta falta de esperança que sentimos. E a esperança é, de resto, a pior coisa que o ser humano pode perder”, conclui Elicidio Bile.